Vergonha de mim

Acabo de chegar em casa.
O mal-estar que sinto é tão forte e evidente que me forço a colocar pra fora o sentimento de decepção por mim mesma. Talvez assim eu consiga sentir-me menos pior. Aconteceu ainda agora, mas se mantém no pensamento e não sai.

Fui lanchar numa praça de alimentação perto de casa. Chegando lá, escolhi onde iria comer e fiz o meu pedido. Sentei numa mesa para dois e esperei que o meu número fosse anunciado. Em questão de minuto um menino se aproximou e me pediu que lhe pagasse um refrigerante. De imediato e no automático, respondi educadamente que não tinha dinheiro. MENTIRA! Eu tinha.

No momento em que lhe neguei o pedido, nos olhamos nos olhos. Ele se afastou sem nada dizer. E eu fiquei ali, com a minha culpa, que ocupou a cadeira à minha frente. Apenas eu e ela. Para dar força à minha atitude, dona da minha verdade e razão, pensei em silêncio que se ele tivesse pedido um prato de comida ou algo para comer, mas veio pedir um refrigerante.

Com esse pensamento, me garanti a certeza de que tinha tomado a decisão mais acertada. No entanto, logo em seguida veio o tapa na cara que eu precisava levar. O garoto tinha conseguido um marmitex de um dos restaurantes. A atendente do mesmo trouxe até ele na mesa, fechadinho e em uma sacola. Ele pediu um garfo, como quem diz: vou comer aqui mesmo. E comeu! Com toda a dignidade que uma criança, com seus 9 ou 10 anos, pode e deve ter.

Ele me pediu um refrigerante porque já tinha a comida garantida. A indigna ali era eu. O arrependimento que eu já tinha tido desde o momento da recusa veio com tudo.

Enquanto ele comia, eu refletia. O meu pedido ficou pronto e, ao passo que eu comia na minha e ele comia na dele, fiquei tentando justificar o meu erro com algumas situações anteriores que vivi e também presenciei. Sim, porque eu já paguei lanches pra crianças e adolescentes que dois passos depois jogaram fora intactos. E vi cenas similares acontecerem com outras pessoas.  

Quando damos um trocado ou pagamos algo que comer a uma criança, jovem ou adulto, não sabemos, ao certo, se realmente estamos ajudando. Mas mesmo com todos esses argumentos, senti que errei. Naquele momento eu estive errada. Eu julguei. Eu sequer perguntei se ele queria algo para comer. O “NÃO” ali era mais fácil.

Sei que já pago meus impostos, mas e o sentido de humanidade? Além do mais, e o lance de fazer a minha parte, em que parte fica? Ao mesmo tempo, fazer a minha parte é apenas atender às solicitações de pedintes?

Sei lá, são tantos os questionamentos. São tantos os sentimentos conflitantes. 

Mas uma coisa é certa nesse episódio: ele comeu sem o refrigerante que lhe neguei. Eu comi e bebi, mas tudo o que ingeri me fez um bocado mal.

Por Patricia Limeres – em 10 de abril de 2012.

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