Aqui dentro é tempestade

Lá fora, ameaça chover. Acho até que os primeiros pingos já tocam o solo espaçadamente e, se eu não estiver enganada, logo cessarão esse pouso tão ansiado. Sei que há quem não goste, mas na secura do cerrado, chuva pouca é bobagem. Dádiva mesmo é chuva das boas: não só carregadas, mas continuadas.  

Já aqui dentro, há tempos, é tempestade. Não aquela tradicional. Nessa, não há nada de úmido. Ao contrário, é tudo seco e ressecado tal qual o cerrado, em período de estiagem. Na realidade, com a tempestade em si, a minha se assemelha apenas pela ventania que leva e traz tanta coisa e tanta gente. Um vendaval de emoções que arrasta e leva tudo, menos o vazio e o cinza que parecem predominar, porque dada a força que têm não há cor e objeto que consigam competir. Às vezes, isso me preocupa, confesso. Mas só às vezes.   

Outra semelhança se dá nas circunstâncias em que tudo se torna tão pesado que as lágrimas se libertam na tentativa de aliviar a angústia. Aí, realmente chove forte, de dentro para fora. E, então, se faz tempestade com tudo o que há de mais poderoso nela.

De tempos em tempos, essa tempestade dá tréguas e, nesses intervalos, consigo ver novamente beleza em pequenos detalhes do cotidiano. Assim, minha esperança é renovada.

Penso que, nas almas inquietas, é quase sempre tempestade. E, definitivamente, sou uma delas. Sempre fui, ainda bem. Porque ser assim me permite observar, questionar e refletir.

Com suas idas e vindas, as minhas tempestades não possuem uma única razão, geralmente são compostas por muitas. A principal delas talvez seja o meu desejo de ser uma pessoa melhor. Se essas tempestades internas me conduzirem algum dia à concretização disso, então, terão valido a pena. Se não, ainda assim, terei feito o constante exercício de tornar-me melhor e mais próxima do que quero ser.

Como eu já previa no início, as gotas que há pouco caiam mal molharam o chão. O sol já retornou com força e calor total e o céu nem parece ter abrigado qualquer nuvem de chuva. É, tudo se transforma o tempo todo. Esse é o maior milagre da vida. Para presenciar a transformação, basta viver e observar. Agora, só me falta encontrar um meio de não limitar-me ao papel de testemunha.  


Por Patricia Limeres – em 27/10/2016

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